A PAZ através da Poesia: O crime não está em agitar, mas em permanecer imóvel
A Paz se canta, se celebra, se conquista, se constrói, se vive de inúmeras maneiras: por palavras, através da música, da arte, da ação. Ela brota dos corações mansos e humildes; dos profetas que buscam fazer com que todos “sejam IRMÃOS”.
O crime não está em agitar, mas em permanecer imóvel
Francisco Julião*
O CRIME NÃO ESTÁ EM AGITAR
Agitador, sim! Como é possível conceber a vida sem agitação? Porque o vento agita a planta, o pólen se une ao pólen de onde nasce o fruto e se abotoa a espiga em que amadurece nas searas. O gameta masculino busca o óvulo porque há uma cauda que o agita. Se coração não se agita, o sangue não circula e a vida se apaga. Que dizer da bandeira que se hasteia ao mastro e não se agita?
É uma bandeira morta.
Qual é, por excelência, o mérito tão grande de Bartolomeu de Las Casas? Haver agitado de maneira tão extraordinária o problema do índio durante sua larga e fecunda existência.
É AGITANDO QUE SE TRANSFORMA A VIDA,
O HOMEM, A SOCIEDADE, O MUNDO.
Quem nega a agitação, nega as leis da natureza, a dialética, a ciência, a justiça, a verdade, a si próprio. Sabe o Físico que para manter a água cristalina tem de agitá-la antes de lhe derramar o sulfato de alumínio que toma as partículas de impureza e desce com elas para o fundo. Manda o médico que se agite certos remédios antes de tomá-los e o farmacêutico chega a escrever nas bulas este aviso:
“AGITE ANTES DE USAR”.
O CRIME NÃO ESTÁ EM AGITAR,
MAS EM PERMANECER IMÓVEL.
Uma sociedade que não se agita é como um charco: suas instituições se estagnam e apodrecem. Inútil, portanto, é tentar reprimir a agitação, envolvendo-a nas malhas do libelo acusatório. Tudo passa sobre a face da terra e debaixo das estrelas, os impérios, as tiranias, os carrascos. Mas a agitação nunca passará. Nem que haja a consumação dos séculos de que falam os profetas bíblicos.
É que ela, a agitação, se nutre de uma paixão.
A PAIXÃO DA VERDADE.
(*Trecho do livro Cambão, a face oculta do Brasil, do ex-deputado pernambucano Francisco Julião. Foi fundador das Ligas Camponesas no início dos anos 60, um precursor do MST para problemas do campo.)
FONTE: https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=333592